O Poder da Linhaça 

O consumo da linhaça associado a dietas com redução de carboidratos favorece a redução de processos inflamatórios relacionados aos fatores de risco cardiovascular.

Por Silvia Marangoni / Foto Ed Viggiani

 

A semente de linhaça vem ganhando papel de destaque em dietas para redução dos fatores de risco cardiovasculares. Essa é a conclusão da pesquisadora Roberta Soares Lara Cassani, mestre e doutora em Investigação Biomédica e Diretora Científica do Departamento de Nutrição da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo – Socesp, autora do estudo Linhaça e lignanas: efeito do consumo sobre indicadores nutricionais e inflamatórios. Segundo ela, a ingestão regular de semente de linhaça triturada, aliada a uma dieta com redução de carboidratos de rápida  absorção, reduz o colesterol e outros fatores de risco para o coração.

“Há muitos estudos em nutrição enfatizando percentuais de carboidratos, proteínas

e gorduras”, diz a pesquisadora. “No estudo, abordei a ação de um macronutriente, a linhaça, por seu caráter de mito: muito se fala sobre os seus poderes de emagrecimento, mas até que ponto e em que medida ela pode, efetivamente, contribuir para a saúde, diminuindo fatores de risco cardiovascular? Essa foi a minha

investigação.”

Dentre as medidas antropométricas (peso, circunferência abdominal e dobras cutâneas) que mais incidem sobre os fatores de risco cardiovasculares, a circunferência abdominal é a que está mais diretamente associada à pré-hipertensão, hipertensão e também colesterol e triglicérides aumentados. O desafio assumido por Roberta Cassani seria descobrir uma forma de intervenção nutricional que, juntamente com o consumo de linhaça, diminuísse os fatores de risco cardiovasculares.

A partir dos resultados da pesquisa, será possível divulgar os benefícios e indicar o uso da linhaça de maneira correta, a fim de que possa ser incluída na alimentação da população.

“Sem orientação específica sobre o consumo dessa semente, as pessoas compram quilos de linhaça e incluindo em sua alimentação de maneira aleatória, sem fazer qualquer mudança na dieta, e esperando que ela, por si só, atue na perda de peso”, afirma a pesquisadora.

No Brasil, existem dois tipos de linhaça marrom, sendo que um deles é mais rico em ômega3. Esse dado, na prática, não altera o resultado final, pois no que diz respeito à redução dos fatores de risco cardiovascular os benefícios de ambas são iguais.

Além disso, pesquisadores canadenses descobriram que, independentemente da quantidade de ômega 3, a linhaça promove a melhora no perfil inflamatório dos pacientes.

“Esse resultado chamou minha atenção, sugerindo a existência de um outro componente presente na linhaça atuando contra os processos inflamatórios: as lignanas, nutrientes do grupo dos polifenóis”, conta Roberta. As duas lignanas estudadas por ela foram a enterolactona e o enterodiol, ambas originadas a partir do precursor secoisolariciresinol diglicosídeo (SDG), que é resultado do processo de absorção da linhaça pela microflora intestinal.

O objetivo foi verificar se os grupos que ingeriram a linhaça obtiveram aumento significativo de enterodiol e enterolactona no sangue, e se esse aumento também pôde ser verificado no grupo controle, que ingeriu placebo. A pesquisa buscou estudar os efeitos da linhaça em dietas intervencionais aplicadas em 52 homens adultos durante 42 dias.

Após avaliações antropométricas e entrevistas de anamnese com o objetivo de detectar os erros individuais na alimentação, foram criados três grupos por sorteio aleatório, sendo que nenhum grupo saberia o que o outro comeria.

O primeiro grupo ingeriu 60g diárias de linhaça e consumiu quantidades de proteína, carboidrato e gordura dentro dos padrões de normalidade praticados pela nutrição clínica.

Enquanto isso, a dieta do segundo grupo teve redução de carboidratos e ligeiro aumento das quantidades de gordura saudável (poli-insaturados) e proteína, mas, em vez de linhaça, recebeu placebo (no caso, arroz cru triturado).

Finalmente, o terceiro grupo ingeriu 60g de linhaça, teve redução de carboidratos e ligeiro aumento das quantidades de proteína e gordura saudável (poli-insaturados).

O primeiro e terceiro grupos, que ingeriram linhaça, receberam 60g diárias: 40g no café da manhã, misturadas ao leite desnatado, e os 20g restantes na hora do almoço, misturadas ao feijão.

Em relação aos valores calóricos das dietas, todos os grupos consumiram a mesma quantidade de calorias (entre 1.800 e 1.900 calorias) e foram avaliados individualmente, sempre nos mesmos horários, uma vez por semana, durante os 42 dias da pesquisa.

Os perfis avaliados durante o estudo incluíram variáveis antropométricas, clínicas e bioquímicas.

Em relação à antropometria, avaliaram-se as dobras centrais (subescapular, suprailíaca e abdominal), o índice de massa corpórea, e as circunferências abdominal e de quadril.

Com relação às variáveis bioquímicas, foram medidos colesterol e frações HDL e LDL, triglicérides, ácido úrico, proteína C reativa ultrassensível (para verificar processos inflamatórios), enterodiol e enterolactona séricos, insulina de jejum, pressão arterial, glicemia de jejum, isoprostane sérico, fator de necrose tumoral alfa (TNF), leptina e adiponectina.

A avaliação do perfil bioquímico inflamatório, nutricional e de fator de risco cardiovascular originou respostas variadas.

Nas dietas com redução de carboidrato, tanto com placebo como com a linhaça, houve redução do colesterol total, LDL, ácido úrico e adiponectina, sendo que a leptina permaneceu estável.

Em relação aos indicadores inflamatórios (variação da proteína C reativa ultrassensível e do TNF alfa), observou-se uma diminuição significativa apenas nos grupos que receberam linhaça, comprovando que a ingestão desse nutriente promoveu aumento das lignanas enterolactona e enterodiol.

 

A mudança de estilo de vida garantirá que os benefícios da linhaça não se perderão

 

Além disso, ao final da pesquisa constatou-se que todos os indivíduos apresentaram significativa perda de peso: em média, 8 quilos. Considerando que um dos grupos recebeu placebo, concluiu-se que a ingestão de linhaça não foi determinante para a perda de peso, mas sim a adoção de uma dieta adequada, com alteração dos valores calóricos ingeridos.

“Concluímos que diminuir a ingestão de carboidratos de absorção rápida (pão branco, arroz polido, massa, batata, biscoitos recheados e outros alimentos muito processados) e adicionar a semente de linhaça triturada – no estudo, 60g, equivalentes a 3 colheres de sopa diárias –, além da perda de peso e de gordura abdominal, favorece a redução das variáveis inflamatórias e outras relacionadas aos fatores de risco cardiovascular”, explica Roberta Cassani.

A nutricionista diz que a mudança do estilo de vida é imprescindível para que os benefícios das lignanas da linhaça não se percam, pois não basta consumir linhaça sem fracionar a dieta e reduzir o consumo excessivo de carboidratos refinados de

absorção rápida. “Os benefícios da linhaça não são mito. Mito é achar que basta consumi-la para perder peso. Ela só vai atuar em seu potencial máximo, se for coadjuvante de uma dieta equilibrada”, afirma a pesquisadora.

 

Propriedades da linhaça

 

A linhaça é considerada um alimento funcional, pois, além dos nutrientes básicos (carboidratos, proteínas, gorduras e fibras), contém elementos que podem proporcionar aumento da defesa orgânica e redução do ritmo de envelhecimento celular.

Pesquisas comprovaram a sua eficácia na proteção da saúde por conter fibras, ômegas 3 e 6, lignanas, vitaminas A, E, B1, B6, potássio, magnésio, fósforo, cálcio, ferro, cobre, zinco, manganês e selênio. O consumo de linhaça está relacionado ao fortalecimento do sistema imunológico, à redução do envelhecimento celular e diminuição do risco de doenças, entre elas câncer de colo, de próstata e de mama. É um dos alimentos mais ricos em ômega 3, diminuindo as taxas de colesterol total, LDL (colesterol ruim), e aumentando as de HDL (colesterol bom). Além disso, a semente de linhaça é a maior fonte da lignana SDG, que favorece a redução das variáveis inflamatórias e outras relacionadas aos fatores de risco cardiovascular.

A segunda maior fonte dessa lignana é o morango e, em seguida, a semente de girassol.

A concentração de SDG em ambos, no entanto, é sensivelmente menor do que a obtida pela semente de linhaça. A linhaça em pó tem de 20 a 370mg de SDG por 100g de alimento, enquanto o morango possui cerca de 1,6 mg de SDG por 100g de alimento e a semente de girassol, 0,6 mg de SDG por 100g de alimento.

 

Fonte: Revista Nutrir – Maio 2010.